DE CÁ E DELÁ

Daqui e dali, dos lugares por onde andei ou por onde gostaria de ter andado, dos mares que naveguei, dos versos que fiz, dos amigos que tive, das terras que amei, dos livros que escrevi.
Por onde me perdi, aonde me encontrei... Hei-de falar muito do que me agrada e pouco do que me desgosta.
O meu trabalho, que fui eu quase todo, ficará de fora deste projecto.
Vou tentar colar umas páginas às outras. Serão precárias, como a vida, e nunca hão-de ser livro. Não é esse o destino de tudo o que se escreve.

segunda-feira, 3 de setembro de 2018





ONTEM COMO HOJE…




      Cada ministério respeitará a verba global que lhe for atribuída.
Nenhum ministério tomará qualquer medida com repercussão financeira sem o acordo prévio do ministério das Finanças.
Este poderá sempre opor o seu veto a aumentos de despesa.
O ministério das finanças colaborará com os demais no estabelecimento de critérios uniformes para redução de despesas ou arrecadamento de receitas.

Estas palavras não são de Mário Centeno. Constam de um discurso proferido por António de Oliveira Salazar em 28/abril/1928.



quinta-feira, 26 de julho de 2018




CRÓNICAS DE VIAGEM


SALAMANCA


Eu tinha passado por Salamanca há mais de meio século, “pendurado” na excursão de finalistas de Medicina da minha cunhada Maria Augusta. Devemos ter demorado lá pouco, pois gravei apenas na memória a imagem da Plaza Mayor.

Plaza Mayor

Desta vez, estivemos lá um dia inteiro. Não é muito tempo e ficou muita coisa por ver, mas chegou para formar uma ideia aproximada da cidade que alberga a Universidade mais antiga da Península Ibérica e a quarta da Europa, onde apenas Bolonha, Oxford e Paris a precederam. Nela estudaram Abraão Zacuto, Calderón de la Barca e os portugueses Pedro Nunes e Amato Lusitano. Cristóvão Colombo deu ali aulas sobre as suas descobertas.

                        Ponte romana e catedral
A economia da cidade de 220.000 habitantes gira atualmente em volta da Universidade e do turismo.
    No século XVI, Salamanca viveu a sua idade de ouro. A cidade contava 6.500 estudantes, numa população de cerca de 24.000 almas. Durante esse período, ensinaram ali muitos dos intelectuais mais ilustres da Europa e foram desenvolvidos conceitos revolucionários na Moral e no Direito, incluindo os direitos à vida, à propriedade e à liberdade de pensamento. Em anos mais recentes, Miguel de Unamuno foi reitor da Universidade. 

   Universidade 


A história da povoação é muito antiga. Em 220 a.C., os cartagineses conquistaram a cidade às tribos de origem celta que a habitavam. Após a vitória romana na Segunda Guerra Púnica (218-201 a.C.), a cidade foi anexada à província da Lusitânia. Com a queda do Império Romano, chegaram os invasores alanos e visigodos. Mais tarde, no ano de 712, os mouros tomaram conta da região e governaram-na até ao século XI. Por essa altura, a relação de forças entre cristãos e mouros começou a inverter-se e iniciou-se a reconquista cristã da Península.

                     Universidade - detalhe da fachada
Passados muitos séculos, durante a Guerra Peninsular, em 1809, a cidade foi ocupada pelas tropas do general Soult, que comandou a segunda invasão francesa a Portugal. Três anos mais tarde, as tropas anglo-lusas comandadas por Arthur Wellesley, mais tarde duque de Wellington, reconquistaram Salamanca. A cidade sofreu muito com a guerra e com o encerramento da Universidade, decretada por Fernando VII. Ao ser reaberta não voltou a recuperar o vigor e o prestígio antigos.
Entre 1936 e 37, o Palácio Episcopal de Salamanca foi a residência e o comando operacional do general Francisco Franco.

Catedral nova

Salamanca é uma das cidades espanholas mais ricas em monumentos da Idade Média, do Renascimento e das épocas barroca e neoclássica. A catedral nova é barroca. Os fiéis tiveram o bom senso de não destruir a velha. Ficam paredes meias e passa-se de uma para outra sem sair à rua. 

                         Porta da catedral nova
São impressionantes a quantidade, a diversidade arquitectónica e a beleza dos edifícios históricos acantonados no centro da cidade.  Salamanca tem ainda a fama de ser o lugar onde se fala o melhor castelhano de Espanha.

                         Convento de San Esteban
A vida social de Salamanca centra-se atualmente na Plaza Mayor, construída no final da primeira metade do século XVIII.

                                             Plaza Mayor
Para nós, portugueses, não deixa de ser curiosa a coincidência entre o nome do rio Tormes, que corre a sudoeste da cidade e a quinta de Tormes que encantou Jacinto em “A cidade e as serras”. O rio é atravessado por uma ponte romana em que, ainda hoje, boa parte dos arcos é de origem.

Nota: a fotografia da ponte romana foi retirada da Internet

quarta-feira, 25 de julho de 2018



CRÓNICAS DE VIAGEM


CIUDAD RODRIGO


Ciudad Rodrigo - muralha e catedral

Quando regressei de Angola, para estudar Medicina em Coimbra, habituei-me a passar as férias grandes em Almendra, a terra onde nasci. As férias grandes e, quase sempre, as do Natal e da Páscoa.
Apanhava um comboio que saía de Coimbra às primeiras horas da madrugada e seguia até Campanhã, onde me mudava para a Linha do Douro. Depois, era acompanhar as curvas do rio até Almendra, a última estação antes da Barca d`Alva, onde fica a fronteira com Espanha. Após a morte de meus pais, a seguir aos meus irmãos, era ali que tinha os parentes mais chegados.

  


A bolsa de estudos que recebia do governo-geral de Angola foi reduzida, ao fim do segundo ano, a dez prestações. Infelizmente, os anos continuaram a contar doze meses cada. Um automóvel era coisa com que nem sequer se sonhava. O comboio era a alternativa possível.

                          Fachada da Capela de Cerralbo (sec. XVII e XVII)
Os meus itinerários eram necessariamente limitados. Ia, de vez em quando, à Meda, onde o meu primo Francisco Trabulo, já ancião, me tratava com galhardia. Deslocava-me ocasionalmente a Figueira do Castelo Rodrigo, que a camioneta alcançava em menos de meia hora. Figueira desenvolveu-se na vizinhança do castelo medieval que faz parte de uma linha de fortificações que se distribuem ao longo da fronteira até Monsaraz e Marvão.

                                         Claustro da catedral
Mesmo anos mais tarde, quando a entrada no mercado de trabalho me proporcionou outras condições de vida, não me deu para viajar até Ciudad Rodrigo, a cidade espanhola mais perto de Almendra.
Sempre me intrigou a partilha de nomes, para mais em povoações fortificadas e relativamente próximas. Após a vitória do rei Ramiro II de Leão, na batalha de Simanca (939) deu-se a progressiva ocupação cristã dos territórios conquistados aos mouros. Rodrigo Tedoniz, cunhado de Mumadona Dias, viria a ser alcaide dos castelos do rei. É-lhe atribuída a reedificação do castelo de Penedono. Ignoro se está ligado a Castelo Rodrigo e a Ciudad Rodrigo, ou se se trata de coincidência de nomes.

                        Vista da catedral
Há alguns dias, eu e a minha mulher, acompanhados pela minha irmã Maria e pelo meu cunhado Sindulfo, saímos de Almendra com destino a Salamanca. No caminho, visitámos Ciudad Rodrigo, onde almoçámos.
É uma pequena cidade com a parte antiga situada no interior das muralhas construídas entre os séculos XII e XIV. Dista 25 quilómetros de Vilar Formoso. Foi, durante algum tempo sede da extinta diocese de Calábria.

                          Ayuntamiento
Tratando-se da única posição fortificada importante entre Salamanca e Portugal, sofreu dois cercos durante as invasões francesas.
Em 1810, o marechal francês Ney tomou a cidade. Os 24 dias que durou o cerco obrigaram Massena a adiar um mês a invasão de Portugal.

                         Plaza Mayor
Dois anos mais tarde, o general inglês Wellington tomou a fortificação aos franceses, no começo da campanha que conduziu à libertação da Península Ibérica. Ciudad Rodrigo foi saqueada tanto pelos franceses como pelos ingleses.

           Catedral. Nesta fotografia é clara a influência românica
A catedral tem uma imponência notável para o tamanho da povoação. Começada a construir no século XII e XIV, revela uma arquitetura mista de românico e de gótico.

segunda-feira, 23 de julho de 2018



FOZ COA

Voltei a Foz Coa, a terra do meu pai. Diz-se, aliás, que todos os Trabulos têm origem na região.


Em visitas anteriores, fotografei o que a cidade tem de belo. Desta vez, deixei-me levar por um diabinho e fui fixando a objetiva da câmara nos sinais de decadência.


Embora Vila Nova de Foz Coa tenha vida própria, mesmo antes do verão e da chegada dos emigrantes, notam-se, mesmo em ruas centrais, vestígios do abandono a que o interior do nosso país parece condenado.


 Nem o facto de se juntarem ali dois Patrimónios Mundiais da UNESCO, o Alto Douro Vinhateiro e as Gravuras Rupestres do Vale do Coa, anima suficientemente a povoação.


Para não deixar uma ideia demasiado severa da terra onde tenho metade das raízes, registo o interior da Igreja de Nossa Senhora do Pranto, que permanece robusta, mesmo com as colunas inclinadas pelo terramoto de 1755, e a estátua da Senhora que deu o nome ao edifício. 


Permaneceu (diz-se) centenas de anos na frontaria, até que a chuva, o vento e os dejetos das aves lhe mudassem a cor da pedra. Mantém alguma serenidade no rosto, mesmo a chorar o filho morto.






O CAMINHO BRANCO


Poucas lembranças conservo dos tempos de meninice que passei em Foz Coa. Terá sido entre os dois e os quatro anos, ou pouco mais. Recordo vagamente a lagoa, que me parecia enorme, e lembro-me de usar calções com racha atrás, como os outros rapazitos. Eram especialmente úteis no tempo frio…
Sei, de ouvir dizer, que morávamos na Rua de S. Miguel. no prédio onde fica hoje a Terrinca. Contaram-me as minhas irmãs que, quando se varria a lareira, aparecia uma inscrição onde se lia “Aqui jaz”. A mentalidade pragmática dos humanos levava-os a reciclar qualquer material que fosse útil à construção.
Colaram-se-me ao espírito outras memórias, nascidas de narrações repetidas. Uma delas foi a lenda do Caminho Branco, onde dançariam as bruxas nas noites de terça e sexta-feira.
Não sou crente, o que me torna mais vulnerável à fantasia.
Há três dias, regressei a Foz Coa e perguntei pelo Caminho Branco a dois homens de meia-idade que conversavam à sombra, sentados num banco de pedra.
A resposta foi pronta:
− Fica perto. Vai por aquela rua (apontou-ma). Vira duas vezes à direita e uma à esquerda e já lá está.
Segui as instruções e encontrei-me no começo duma calçada larga, muito limpa, delimitada por muros de xisto que abrigavam prédios com olivais. Avistavam-se ao fundo casas novas.


Perguntei a uma moça jeitosa que passava por ali, de telemóvel na mão:
− Menina! É este o Caminho Branco?
A moça sorriu, admirada talvez pela minha ignorância.
− É sim. Vai dar às piscinas.
Guardou o sorriso e prosseguiu o caminho e a teleconversa.
Olhei em volta, um pouco a medo, mas não avistei bruxas, nem sinais delas. Na verdade, não era terça-feira e a meia-noite estava longe.


Voltei para o carro e conduzi em direção a Almendra, com a imaginação a baralhar-me os sentidos. E se aquela rapariga fosse bruxa e se juntasse ás outras nas terças-feiras à noite, para dançar nua no Caminho Branco?



terça-feira, 8 de maio de 2018



ADEUS, ÁLVARO!



O tenente-coronel Álvaro Henrique Fernandes morreu na noite de 6 de maio. A cerimónia fúnebre decorreu hoje.
Foi mais um amigo que perdi.
Conhecemo-nos em Coimbra, em 1960. Éramos da mesma idade e vínhamos ambos de Angola, ele de Luanda e eu do Lubango. Quem trocava o convívio dos seus pelo sonho duma formação universitária e de um futuro melhor sujeitava-se a uma carência prolongada de afetos. Eu fui poupado a essa experiência penosa, por ter vindo acompanhado da minha mãe e de uma das minhas irmãs.
Os jovens defendiam-se da solidão aproximando-se de colegas oriundos de regiões próximas. Os angolanos chegavam-se uns aos outros, do mesmo modo que o faziam os moçambicanos.
Nessa altura, sopravam fortes os ventos da História e tornava-se clara a necessidade de libertar as colónias e democratizar e modernizar o país. Formou-se um núcleo muito politizado de estudantes angolanos e são-tomenses que, com diversas saídas e entradas, acabou por levar à formação do Kimbo dos Sobas o qual, vários anos mais tarde, se transformaria em república.
− Eu percebo mais de matemática que o Segadães! – Proclamava o Álvaro, há cinquenta e tal anos.
Talvez percebesse, mas o António Segadães Tavares demonstrou muito cedo, para além da inteligência comum a ambos, a disciplina de trabalho que lhe iria granjear, anos mais tarde, reputação internacional.  
O Álvaro mudou-se de Coimbra para Lisboa e, a dada altura, interrompeu o curso e foi para a tropa. Serviu dois anos como alferes miliciano de transmissões de Infantaria em Moçambique. Entretanto, casou e descasou.
Voltei a encontrá-lo em Mafra, no outono de 1969. Eu tinha sido mobilizado para o curso de Oficiais Milicianos enquanto ele frequentava o curso de capitães.
Soube depois que tinha sido enviado para Angola, para comandar uma Companhia. Perdi-o de vista, durante algum tempo.
Reapareceu no 25 de Abril, de forma notável. Ajudou a ocupar o comando do Depósito Geral de Adidos e desempenhou um papel fundamental na ligação entre o posto de comando do MFA e as unidades que iam tomando conta de Lisboa. 
Sempre ligado a Otelo Saraiva de Carvalho e ao COPCON, encorajou o “movimento popular” que alastrava no país. No “verão quente” de 1975, ajudou a distribuir por militantes de esquerda várias centenas de espingardas G3 retiradas do depósito de Beirolas. Ficou então conhecido como o “Capitão Fernandes”, o homem que entregou armamento aos comunistas. Assumiu sozinho o desvio das G3 e teve de se refugiar em Paris, onde se fez jornalista.
Contou-me, anos mais tarde, como as coisas aconteceram, sem se alargar em pormenores.
− Trabulo! A distribuição das armas foi decidida numa reunião do COPCON em que estavam presentes 17 oficiais. Alguém tinha que arcar com aquela responsabilidade. Eu disponibilizei-me para isso.
Era o Álvaro no seu melhor. Galhardo, generoso, cavalheiro, tendendo a tomar posições quixotescas. Ainda hoje é odiado por uma certa Direita política.
Calhou avistá-lo numa visita clandestina a Portugal, no aeroporto de Lisboa. Sorri e quase me ri. Ele no meio, o Zé Marvão e a Rosário aos lados, formavam um grupo de aspeto tão comprometido que qualquer bufo que andasse por perto ficaria desconfiado. Felizmente, a geração dos bufos acabara com o 25 de Abril.
Álvaro Fernandes regressou a Portugal em 1978 e passou algum tempo detido. Após certas vicissitudes, em 1983 acabou por ser reintegrado no Exército Português.
O Álvaro não foi apenas um militar político, ou um político-militar. Era um escritor de talento. Escreveu quatro livros: Portugal, nem tudo está perdido (1976), Berços de renda, enxergas de trapo (1981), Kianda, o rio da Sede (1996) e Testemunho de um país novo (2003). Ofereceu-me três. Li-os com agrado. Desconheço o “Berços de renda”. Sei que, perto do fim da vida, já não tinha exemplares das obras que escrevera. Era um homem que dava tudo. 
Almoçávamos (raramente) em casa um do outro, e trocávamos impressões, geralmente por correio eletrónico. Nem sempre estávamos de acordo, mas havia respeito nas discordâncias.
O Álvaro colaborou na preparação do meu ensaio “A Guerra da Guiné”, prestando informações valiosas sobre questões militares. É dele a frase que dá começo ao livro: “ A história de uma guerra não estará completa enquanto for baseada unicamente na visão de um dos contendores”.
Ao adoecer, procurou exorcizar os seus fantasmas expondo publicamente o seu sofrimento no Facebook. Espero que essa espécie de fuga para a frente lhe tenha proporcionado algum alívio.


Lembrar o Álvaro é também recordar a juventude e os começos do Kimbo dos Sobas. De um grupo pouco organizado de estudantes, quase todos com origem ou vivência africana, saíram um primeiro-ministro de São Tomé e Príncipe, um herói nacional angolano, dois generais das FAPLA, um capitão de Abril, um dos engenheiros portugueses mais reconhecidos além-fronteiras, pelo menos sete escritores, um cineasta e dois mártires.
Parece extraordinário, para um núcleo que nunca foi numeroso.
Termino exprimindo os meus sentimentos de pesar à família. De algum modo, estamos todos de luto.

sábado, 14 de abril de 2018




QUE NOS DIZEM AS MÁSCARAS?




A maior parte das minhas máscaras dorme no vão da escada. Outras estão por aí, em paredes ou armários.
Imagino que conversem, durante a noite.
Mesmo de dia, caladas, contam-nos coisas. 



Tanto quanto se sabe, as máscaras existiram em todas as culturas. Persistem entre nós, no nordeste do país, mas assumem ainda hoje uma vitalidade impressionante entre certos povos africanos e sul-americanos.
São geralmente feitas de materiais perecíveis, como o couro, a madeira ou a porcelana. Há exceções notáveis, executadas em metais preciosos e representando reis. É o caso da máscara funerária de Agamenon, o lendário rei de Micenas que terá liderado os gregos no cerco a Troia. 


  E da famosa máscara do egípcio Tutankamon




A madeira foi sempre o material mais usado pelos artífices. O caruncho e os seus parentes xilófagos devoram também cultura. São raras as peças esculpidas em troncos de árvore que resistem ao correr dos séculos.
Aprendemos a fazer máscaras mais ou mesmo ao mesmo tempo em que aprendemos a mentir, isto é, logo depois de proferirmos as primeiras palavras. Fingir, representar, é próprio do homem.
Julgo, que mesmo antes de criar instrumentes cortantes eficazes, o homem aprendeu a esconder-se atrás de ramos de árvores, de cascas de plantas, ou de crânios e de peles de animais.
As máscaras dizem-nos coisas sobre as civilizações que as produziram e sobre o modo de pensar dos seus escultores. Transmitem-nos sentimentos.
      Expectativa? Aceitação? Perplexidade?     



            O silêncio de quem guarda os mistérios


                que não devem ser revelados?




A serenidade da beleza que se sabe fugaz



O vazio da expressão do homem-pássaro que sabe que não voltará a voar



        Assiste-se à dualidade de Janus, que não

        se compromete com qualquer dos mundos



             Ao anseio pelo som dos tambores 

                   para que comece a dança



Há quem se espante com a diversidade do mundo.




Quem pretenda afrontar o demónio



E quem seja o próprio demónio.



    As máscaras dizem-nos quase tudo o que 

                    queiramos ouvir, ou ler.


  Umas confrontam-nos com a certeza da morte



      E outras mostram os diabos tristes 

                      dos nossos carnavais



         Há as que revelam a besta que

                  se esconde dentro de nós.




           E as que nos ligam, de forma mágica, 

                       ao mundo animal.


Algumas denunciam a angústia de não terem por trás um rosto humano, pois as máscaras dão feições aos espíritos e aos medos que assombram as noites dos homens.

                   Ponho esta máscara


                              E esta


                          e depois esta.



Retiro-as.
       Mudei?
       Fiquei o mesmo?

    Se as máscaras tentarem mesmo conversar, nas horas do meu sono, hão de ter dificuldade em entender-se umas às outras. Provém de locais diferentes do globo e, que eu saiba, não se encontra um intérprete entre elas.